Em todo ano de eleições presidenciais, eu cogito ir atrás de terapia.

Não sou a pessoa mais sensata do mundo e confesso que meu tico e teco conversam de formas misteriosas, mas eu sempre dou um jeito de resolver meus problemas. Eu sou muito bom nisso: desenrolar meus conflitos internos, entender meus sentimentos, me autopropor planos de ação... Sei que tem coisas que só uma boa terapia poderia fazer por mim, mas, enquanto eu acho que estou indo bem, prefiro usar meu tempo e dinheiro em outras coisas. Até aí tudo bem.

Mas chegam as eleições e fico todo quebrado.


Falha minha, mas eu nunca tinha prestado atenção em política antes de 2018. Me pergunte qualquer coisa dentro desse tema que aconteceu há mais de 5 anos e eu simplesmente não sei. Não lembro. Como se eu nem fosse brasileiro desde que nasci. Como se não fosse importante. Como se os direitos e o acesso a políticas públicas sempre estivessem por aqui e fossem durar para sempre.

Não sei dizer bem o que rolou em 2018, mas de repente só dava eleições nas redes sociais. Eu nunca tinha ouvido falar de Bolsonaro e gostaria de ter continuado assim. Não foi possível. Inclusive, essa deve ter sido uma das frases que mais repeti em 2018: não é possível. Porque, quanto mais eu ficava sabendo quem era esse homem, menos achava provável que alguém assim poderia vencer uma eleição. Não falava nada com nada, quando abria a boca era melhor ter ficado quieto, produzia provas contra si mesmo cinquenta vezes por segundo, ofendia todo mundo, como se ele se esforçasse pra isso. Eu estava acostumado ao senso comum de que politico é tudo safado, ladrão, malandro, mas... biruta? A vitória dele foi um baque pra mim.

Meus amigos evangélicos e colegas de trabalho comemoraram.


Eu sou muito fraco pra isso de polarização. Odeio ter que odiar pessoas. Acho que essa lerdeza vem dos meus tempos de igreja, quando eu lia a Bíblia de cabo a rabo pra aprender a ser mais parecido com Jesus o mais rápido possível. Um horror, não recomendo. Nunca me recuperei. Estou sempre querendo ver o outro lado. Ela te respondeu atravessado? Calma, amiga, ela deve estar tendo um dia ruim. O vizinho te xingou? Deve ter algum motivo para ele agir assim, vamos conversar. Sua esposa deu dois tiros no senhor? Mas ela não atirou pra matar, né, temos que considerar isso. Eles estão votando em alguém que aparentemente quer que eu tenha apenas o direito de respirar e mesmo esse talvez ele quer me tirar já que tentou me matar de fome, doença e desemprego? Talvez eles não estejam entendendo...

Às vezes eu acho que foi por causa de gente bunda mole que nem eu que o nazismo comeu solto na Alemanha.

E é por isso que eu passo mal todo mês de Outubro, de 4 em 4 anos. Não é que eu esteja em cima do muro. Deus me livre votar em Biroliro, faço o L até com o cu se me pedirem. Mas eu sempre fico tentando entender e relevar as pessoas que eu gosto que admiram o desgoverno. São quase objetos de estudo pra mim.


Porque, assim, NÃO FAZ SENTIDO NENHUM. Brasil no mapa da fome, desemprego mais alto do que nunca, entrar no mercado com 100 reais e sair só com uma margarina Doriana e uma dúzia de ovos embaixo do braço, pelo amor de Deus. A pandemia, gente. A CLOROQUINA. Não é nem piada dizer que a gente sobreviveu a esses 4 anos, porque teve gente que realmente morreu. Então, se tudo é tão óbvio assim, como que tem gente que apoia?

Outro dia aí eu li o livro Dez argumentos para você deletar AGORA suas redes sociais e, apesar dele não ter conseguido que eu deletasse nem 1 (uma) unidade de rede social da minha vida, teve uma coisa que li nele que eu nunca mais esqueci. Os algoritmos por livre e espontânea vontade criam bolhas tão diferentes e isoladas umas das outras que os fatos que valem nessas bolhas acabam sendo totalmente opostos. Nem quem criou os algoritmos sabe por que eles fazem isso, mas eles fazem. Significa que o Instagram, por exemplo, me mostra um mundo de coisas, mas mostra pro meu amigo evangélico o mundo invertido. Tudo é baseado no ódio, que é a emoção que mais engaja nas redes sociais (já sabíamos disso, né), então pra mim aparecem as coisas MAIS HORRENDAS que as pessoas X fizeram, sejam elas falsas ou verdadeiras, enquanto pro meu amigo só dá gente Y tocando o terror. Se eu paro pra conversar com ele sobre gente X e Y, não vamos nos entender, porque já fomos expostos a uma visão frequente desses "fatos".

Isso sou eu novamente querendo entender o outro lado. Mas graças a Deus também chegando à conclusão de que NÃO ADIANTA CONVERSAR com gente doida.

Eu tento muito me guiar pelos fatos. Tenho muito medo de eu ser a pessoa doida da história. É muito fácil achar que estamos certos o tempo todo, mas eu costumo reavaliar minhas convicções com frequência. Eu particularmente até gosto de entrar nas discussões já achando que estou errado, pra que outros me convençam. Mas dessa vez é diferente. Eu vivi isso. Eu li as notícias, as atuações constrangedoras do presidente, o total descaso com a pandemia, os preços subindo diariamente. Eu vi isso tudo porque dessa vez eu estava prestando atenção. Mas e quem não estava?

Droga, fiz de novo.

Eu acho que eu não sou a pessoa mais indicada pra estar ali na frente da guerra, sabe. Quem vai dar paulada, queimar carro, descer bolsominion na bicuda. Me falta personalidade. Por mais que eu realmente acredite nisso de ouvir o outro lado, eu imploro para que alguém me dê dois tapas na cara se eu ousar abrir a boca pra dizer isso novamente. E eu tô avisando porque eu sei que vou falar. Me mantenham em cativeiro, só me soltem pra votar no Lula no dia 30. NÃO OUÇAM NADA QUE EU DISSER. Não é o momento. Façam o que precisa ser feito. Não é a hora de gente galera agora, depois a gente resolve isso.

Porque eu acho que já entendi que essa dinâmica da empatia só funciona se o outro lado estiver com essa mesma abordagem. Do contrário, enquanto estou aqui dando terceiras chances, eles estão tomando o Brasil, fazendo atrocidade atrás de atrocidade. Acho triste, mas de fato nunca fizeram revolução com flores. Aquele princípio lá de que não dá para ser tolerante com intolerantes.

Eu só sou fraco. Reconhecer é o primeiro passo, eu acho. Vou conversar isso com a psicóloga.