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É isso, gente, 2022 acabou. Todo mundo largando os livros! Mão pra cima! Quem não leu não lê mais. Se até agora essa leitura aí não deslanchou, não vai ser nos últimos segundos do ano que vai rolar, quando nossa mente se transforma em geleca à espera de um recomeço. Eu geralmente espero o ano acabar para fazer minha lista de Melhores Livros do Ano, porque nunca se sabe se o livro perfeito vai aparecer, mas esse ano eu sei. Chega. Vamos parar de se iludir.


Em 2022 eu li 42 histórias, entre romances, contos e novelas. 3 a mais que no ano passado! Do total, 30 foram livros nacionais e eu me orgulho demais disso, até porque não fiz esforço nenhum pra que isso acontecesse. Simplesmente li o que quis, o que tinha a ver comigo. Foram bem poucos os livros que não gostei, e isso deveria ter tornado meu trabalho aqui muito difícil, mas esse também foi um ano de poucas paixões literárias. Eu de fato gostei de muitas histórias, mas AMAR MESMO foram meia dúzia, e é essa meia dúzia que quero compartilhar com vocês.

Quem me acompanha em outras redes sociais vai ter pouquíssimas surpresas, porque quando eu AMO um livro eu falo dele até cansar, mas, vamos lá, todo mundo anotando pra ser feliz em 2023.

Em ordem cronológica de leitura, VAMOS AOS MELHORES DO ANO!

(Ah! Todos os links pra Amazon nesse texto são do programa de afiliados, o que significa que eu ganho comissão se vocês comprarem qualquer coisa através deles)

NOSSO LUGAR ENTRE COMETAS (FERNANDA NIA)

Eu paguei muita língua com esse livro porque vivo dizendo que ficção adolescente não me toca mais. Bom, parece que EU MENTI. Nessa história, 3 adolescentes anseiam pelo autógrafo da autora internacional favorita deles num evento gigante estilo Bienal do Livro. Só quem já tentou pegar o autógrafo de uma Cassandra Clare, Colleen Hoover, John Green da vida sabe o CAOS que é. Apesar dos planos mirabolantes, esse livro é carregado inteirinho pelos protagonistas e seus dramas, conflitos e personalidades peculiares. Claro que eu amei porque esse livro também é uma comédia, com piadas muito bem escritas. Sério, gente, O PRAZER de ler piadas tão bem articuladas. Eu chorei de rir, chorei de emoção, gritei de tanta fofura. Eu indico muito pra quem ama histórias sobre amor aos livros. Confesso que, mesmo sendo um leitor assíduo, eu acho esse tema super cafona, mas aqui em Nosso Lugar Entre Cometas eu tomei um safanão na cara que só uma história boa poderia me dar. Bem feito.

A ESTRADA INFINITA (DENYS SCHMITT)

E lá fui eu ler mais uma ficção adolescente porque claramente já tinha perdido todo o controle da minha vida. Gente. Não é só a capa que é de milhões. Esse novelinha é bonita por dentro. Dois meninos precisam defender uma estrada no Rio Grande do Sul, mas eles fazem isso de um jeito tão poético. E eu nem sou fã de poesia. É sensível, fofo, divertido. E o que eu mais gosto é que o livro é simplesmente econômico. Não é aquela poesia voa voa andorinha voa e vai buscar eu ser que usa 5 linhas pra descrever uma árvore. A Estrada Infinita não desperdiça palavras, não desperdiça frases nem tem cenas em vão. Tudo está ali por algum motivo e os diálogos são retomados nos momentos certos, nada fica para trás. Esse aqui eu realmente indico pra todo mundo, são 68 páginas universais.

TODAS AS MENTIRAS QUE EU NUNCA QUIS CONTAR (ARIEL F. HITZ)

Da lista inteira, esse é o único livro que foi de fato lançado em 2022, para vocês verem como estou ligadinho com as tendências. Eu sinceramente não sei bem o que fui fazer no Tiktok. Vocês sabem que eu amo personagens LGBT+ adultos vivendo dramas familiares, e esse aqui entrega demais. Paulo é filho de um serial killer que já está na cadeia, mas sua vida é afetada quando seu pai se mata na prisão. A imprensa vai com tudo pra cima de Paulo, ressuscitando os boatos infundados de que Paulo colaborava com o pai nos assassinatos. Tudo ainda é mais dolorido porque os jornalistas não respeitam o fato de Paulo ser um homem trans. Sério, gente, eu nunca tinha parado para pensar em como vive a família de um serial killer. O livro é poético, sensível e merecia estar em todas as livrarias do Brasil.

PIRANESI (SUSANNA CLARKE)

Único internacional da lista, esse livro foi uma gratíssima surpresa. A capa não diz nada. A sinopse também não. Eu achava que era a história de um fauno, sei lá, uma vibe meio As Crônicas de Nárnia. Eu mal sei dizer se esse livro é realmente uma fantasia. A maioria das pessoas diz que sim, mas eu acho que discordo. Piranesi tem um suspense tão poderoso que é um prazer virar as páginas enquanto ele se desenrola e a fantasia vai assumindo contornos que a gente nunca imaginou. É a história de um homem - 100% humano, 0% fauno - que vive sozinho num mundo peculiar e se dedica a documentá-lo. As coisas começam a ficar estranhas quando eventos e elementos surgem nesse mundo e parecem não fazer sentido com tudo o que ele já conhecia. Eu acho que fãs de fantasia se frustram um pouquinho. Mas o livro dá um show para fãs de um bom suspense. A edição física é LINDÍSSIMA.

A MARIANA ERRADA (JULIA BRAGA)

Gente, é isso, eu amo ficções adolescentes, essa é a verdade. Eu fico ligeiramente incomodado quando falam que YA de romance é "livro bobinho" porque esse aqui é um livro de humor finíssimo. O quanto eu ri com a rivalidade dessas duas! Além disso, as piadas e as referências estão todas onde deveriam estar. Nesse livro, duas meninas, arqui-inimigas uma da outra, são algemadas por engano numa festa junina. Lógico que é um romance, graças a Deus. A Mariana Errada acerta em tantos pontos que já teve seus direitos comprados para virar filme. Ansioso pra ver na TV!

***

Hora de distribuir os troféus dessa newsletter e vai ter bicampeonato, gente. NÃO HÁ COMO eu não entregar o troféu de PESSOA DO ANO novamente pro Vitor Martins. Reizinho pra sempre dominando nossos corações. 

Eu acabei de ler esses dias Se a casa 8 falasse, um livro onde uma casa muito bem-humorada narra a vida dos moradores, que, além de ser divertido, FOI FINALISTA DO JABUTI. SIM. UM LIVRO YA NO JABUTI. UM LIVRO LGBT+. JOVEM. NO FUCKING PRÊMIO JABUTI. Eu nunca imaginei que essa possibilidade existisse. Eu venho de uma realidade, de uma bolha de escritores, em que nossos livros sempre aparecem nas votações de, sei lá, da revista Capricho, mas nunca na lista dos indicados aos prêmios mais badalados do meio literário. O JABUTI, GENTE. O Vitor foi lá e fez. Eu mal tenho palavras. Isso abre porta pra tanta gente tentar também! E quem sabe até vencer. Se a casa 8 falasse não chegou a levar o prêmio, mas todo mundo sabe que ser finalista do Jabuti já é sinônimo de vencer na vida. ORGULHO DEMAIS!

***

Agora, gente, o livro do ano. Eu já indiquei esse livro tantas vezes desde que o li em abril que é impossível eu não me repetir.

NINGUÉM MORRE SEM SER ANUNCIADO (PAULA GOMES)

Caramba, Paula Gomes INVENTOU a escrita criativa, não é possível. Eu nunca nunca nunca li um livro que seja como esse, simplesmente não existe outro livro que eu tenha lido que eu possa dizer "Nossa, faz parzinho com aquele da Paula Gomes". Não tem. No contexto do livro, as pessoas mais ou menos sabem como/quando vão morrer, existe um sistema que simplesmente te informa. A protagonista sabe que em breve vai morrer com uma machadada na cabeça (!!!) e o livro mostra como essa informação molda toda a vida e os relacionamentos que Ceci mantém. Família, amigos, trabalho. Seria uma história trágica se não fosse uma comédia HILÁRIA. E não é só o conteúdo, mas o jeito que a história é escrita, o formato peculiar. Lembro que resolvi ler esse livro porque vi uma resenha dizendo que era uma mistura de Fleabag com Laurinha Lero. Não mentiu. Mas o que eu encontrei foi muito melhor do que a mistura disso com aquilo. "Ninguém morre sem ser anunciado" me causou aquele sentimento de novidade que raramente livros me causam.

De fato, não é um livro pra todo mundo. Já indiquei para pessoas que amaram, mas também teve gente que não conseguiu chegar ao final Meus pêsames, fracassadas kkkk. Então vá de coração aberto porque pode ser uma experiência literária incrível!

***

É isso, gente! Quem é de Skoob pode conferir a lista completa dos livros que li esse ano e aqui no site eu também mantenho uma lista com os últimos 12 livros que eu li e amei. Pra quem quiser mais indicações, tem os melhores de 2021 aqui.

Já conhecia algum dos livros da lista? O que você tem para me indicar para 2023 que vai me fazer feliz? Só responder essa newsletter como um e-mail comum.

Feliz ano novo, gente!

Até breve :)


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Eu sou introvertido.

Confesso que eu sempre soube, até porque não tinha outra opção. Eu ADORO ficar sozinho, e às vezes apenas um guindaste consegue me tirar de casa. Eu não "fico em casa", eu hiberno. Lugares com muita gente me cansam. Fico todo atrapalhado se preciso falar em público ou conhecer gente nova sem ter me preparado antes. Às vezes acho que virei escritor porque boa parte do meu trabalho é ficar conversando apenas com as vozes da minha cabeça.


Outro dia eu estava dizendo que foi uma grande surpresa eu descobrir que gosto de gravar tiktoks e reels, porque, né. Mas agora, pensando melhor, vejo que não tem nada mais introvertido do que ficar falando sozinho em casa, seja para uma câmera ou para as paredes. Não importa que eu estou aparecendo no celular de milhares de pessoas desconhecidas, que meus tweets vão a lugares que eu nem sabia que existiam, que meu livro chegue em cidades nas quais nunca pisei. Não estou vendo a cara de ninguém. Essas pessoas não estão aqui. Se estivessem, eu com certeza não escreveria nenhuma linha. Eu mando meu marido SUMIR quando quero gravar uma piada de humor duvidoso para o Tiktok.

Eu também pensaria que um ser humano com essa configuração teria dificuldade em interagir socialmente e cultivar amizades. Bom, ele tem mesmo. Eu tenho. Mas a questão é que, por ser introvertido, eu também penso demais e valorizo CADA PESSOA LEGAL QUE ENTRA NA MINHA VIDA. Justamente porque, pra começo de conversa, já foi dificílimo essa pessoa entrar.

Eu odeio perder pessoas.

Não estou falando de morte, embora seja mesmo horrível quando nossos amigos vão de arrasta pra cima, porque a morte na maioria das vezes é inevitável. Está além do nosso controle. Quando uma pessoa querida morre, o que nos consola é ficar grato pelo tempo que passamos juntos. A morte é compreensível. É, no mínimo, aceitável. A derrota para mim é quando perdemos pessoas que ainda estão vivas.

Vamos deixar para lá também as pessoas horríveis. As que pareciam amigas e deixaram de ser, as que nos magoaram de uma forma irreversível, essas precisam ir com Deus mesmo. A dor que eu sinto é quando pessoas que a gente gosta, pessoas comprovadamente legais, que fazem bem pra nossa saúde mental, nossa fauna e flora, pessoas que acima de tudo a gente sabe que GOSTAM DA GENTE, a dor é quando esse tipo de pessoa simplesmente some da nossa vida.

Assim, por qualquer motivo.

Usam muito a frase "A vida aconteceu". Por que vocês pararam de se falar? Não sei, a vida aconteceu. Ela foi indo mais para lá, eu fui vindo mais para cá. Um dia a gente se desencontrou de vez e estamos nisso. Nunca mais vi.

Você provavelmente sabe do que eu estou falando. Cadê aquela sua melhor amiga? E aquele cara que por um período da vida vocês conversavam horrores e trocavam confidências e agora você nem sabe direito se está vivo ou morto? E aquela pessoa que você conheceu, sei lá, na escola, na faculdade, que parecia ser da sua família e agora é só um @ no Instagram com o qual você nunca mais conversou além da troca de likes?


Não rolou uma briga, um desentendimento, não existe um ranço nem nada. Um dia você por acaso deixou para lá, no outro também, a pessoa também não veio atrás e ficou nisso. A vida aconteceu. Eu acabei de falar que a morte é inevitável e sei que amizades morrem, mas eu não aceito quando elas morrem assim.

Tenho pavor dessa vida que "acontece". Todo mundo tem uma vida, e uma característica dessas vidas é que de fato elas estão sempre acontecendo. Eu enquanto pessoa que pensa demais não consigo deixar meus amigos nas mãos disso. VOU PERDER UMA PESSOA MARAVILHOSA POR NADA??? Eu entendo desinteresse, entendo que as pessoas mudam, a descoberta de que na verdade vocês nunca foram tão compatíveis assim, mas existem pessoas incríveis que simplesmente saíram da nossa vida e a gente mal percebeu. Porque esquecemos de cultivar a amizade. Não por maldade, por descuido mesmo. Ou por ser impossível regar tantas amizades ao mesmo tempo, por algumas pessoas serem naturalmente mais presentes que outras ou por uns exigirem mais atenção.

O agravante de ser introvertido é que é muito fácil deixar as pessoas para lá.

Eu não tenho energia para ficar em contato o tempo todo. Eu não faço visitas com frequência, também não sou muito de chamar pessoas para minha casa. A verdade é que eu gosto de sair, mas quando estou em casa parece que esqueço disso. Eu adoro a minha própria companhia. É muito difícil eu sentir saudades de alguém. Aí é que mora o perigo. Quando eu pisco, passou 6 meses e esqueci o rosto de alguma amiga querida.

Alguns acham exagero da minha parte, mas óbvio que fiz uma lista. De amigos. De pessoas que eu gosto. Tem uns anos já. Todo mês eu vou lá e sorteio gente legal que não vejo há meses quando quero sair e ver o mundo. Pronto, tá todo mundo vivo, bonito e feliz comigo. Vamos para os próximos. O efeito colateral é que eu custo a perder gente. Demoro um ano para rodar a lista toda.

Meu marido fica apavorado com meus métodos robóticos de cultivar minhas amizades, mas nunca me apresentaram um jeito melhor. Arthur fica "Pra que isso??? É só marcar quando tiver vontade!". E quando eu tenho vontade, gente? Minha vontade é transformar minha casa num santuário e, quando a hora chegar, num jazigo.


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Em todo ano de eleições presidenciais, eu cogito ir atrás de terapia.

Não sou a pessoa mais sensata do mundo e confesso que meu tico e teco conversam de formas misteriosas, mas eu sempre dou um jeito de resolver meus problemas. Eu sou muito bom nisso: desenrolar meus conflitos internos, entender meus sentimentos, me autopropor planos de ação... Sei que tem coisas que só uma boa terapia poderia fazer por mim, mas, enquanto eu acho que estou indo bem, prefiro usar meu tempo e dinheiro em outras coisas. Até aí tudo bem.

Mas chegam as eleições e fico todo quebrado.


Falha minha, mas eu nunca tinha prestado atenção em política antes de 2018. Me pergunte qualquer coisa dentro desse tema que aconteceu há mais de 5 anos e eu simplesmente não sei. Não lembro. Como se eu nem fosse brasileiro desde que nasci. Como se não fosse importante. Como se os direitos e o acesso a políticas públicas sempre estivessem por aqui e fossem durar para sempre.

Não sei dizer bem o que rolou em 2018, mas de repente só dava eleições nas redes sociais. Eu nunca tinha ouvido falar de Bolsonaro e gostaria de ter continuado assim. Não foi possível. Inclusive, essa deve ter sido uma das frases que mais repeti em 2018: não é possível. Porque, quanto mais eu ficava sabendo quem era esse homem, menos achava provável que alguém assim poderia vencer uma eleição. Não falava nada com nada, quando abria a boca era melhor ter ficado quieto, produzia provas contra si mesmo cinquenta vezes por segundo, ofendia todo mundo, como se ele se esforçasse pra isso. Eu estava acostumado ao senso comum de que politico é tudo safado, ladrão, malandro, mas... biruta? A vitória dele foi um baque pra mim.

Meus amigos evangélicos e colegas de trabalho comemoraram.


Eu sou muito fraco pra isso de polarização. Odeio ter que odiar pessoas. Acho que essa lerdeza vem dos meus tempos de igreja, quando eu lia a Bíblia de cabo a rabo pra aprender a ser mais parecido com Jesus o mais rápido possível. Um horror, não recomendo. Nunca me recuperei. Estou sempre querendo ver o outro lado. Ela te respondeu atravessado? Calma, amiga, ela deve estar tendo um dia ruim. O vizinho te xingou? Deve ter algum motivo para ele agir assim, vamos conversar. Sua esposa deu dois tiros no senhor? Mas ela não atirou pra matar, né, temos que considerar isso. Eles estão votando em alguém que aparentemente quer que eu tenha apenas o direito de respirar e mesmo esse talvez ele quer me tirar já que tentou me matar de fome, doença e desemprego? Talvez eles não estejam entendendo...

Às vezes eu acho que foi por causa de gente bunda mole que nem eu que o nazismo comeu solto na Alemanha.

E é por isso que eu passo mal todo mês de Outubro, de 4 em 4 anos. Não é que eu esteja em cima do muro. Deus me livre votar em Biroliro, faço o L até com o cu se me pedirem. Mas eu sempre fico tentando entender e relevar as pessoas que eu gosto que admiram o desgoverno. São quase objetos de estudo pra mim.


Porque, assim, NÃO FAZ SENTIDO NENHUM. Brasil no mapa da fome, desemprego mais alto do que nunca, entrar no mercado com 100 reais e sair só com uma margarina Doriana e uma dúzia de ovos embaixo do braço, pelo amor de Deus. A pandemia, gente. A CLOROQUINA. Não é nem piada dizer que a gente sobreviveu a esses 4 anos, porque teve gente que realmente morreu. Então, se tudo é tão óbvio assim, como que tem gente que apoia?

Outro dia aí eu li o livro Dez argumentos para você deletar AGORA suas redes sociais e, apesar dele não ter conseguido que eu deletasse nem 1 (uma) unidade de rede social da minha vida, teve uma coisa que li nele que eu nunca mais esqueci. Os algoritmos por livre e espontânea vontade criam bolhas tão diferentes e isoladas umas das outras que os fatos que valem nessas bolhas acabam sendo totalmente opostos. Nem quem criou os algoritmos sabe por que eles fazem isso, mas eles fazem. Significa que o Instagram, por exemplo, me mostra um mundo de coisas, mas mostra pro meu amigo evangélico o mundo invertido. Tudo é baseado no ódio, que é a emoção que mais engaja nas redes sociais (já sabíamos disso, né), então pra mim aparecem as coisas MAIS HORRENDAS que as pessoas X fizeram, sejam elas falsas ou verdadeiras, enquanto pro meu amigo só dá gente Y tocando o terror. Se eu paro pra conversar com ele sobre gente X e Y, não vamos nos entender, porque já fomos expostos a uma visão frequente desses "fatos".

Isso sou eu novamente querendo entender o outro lado. Mas graças a Deus também chegando à conclusão de que NÃO ADIANTA CONVERSAR com gente doida.

Eu tento muito me guiar pelos fatos. Tenho muito medo de eu ser a pessoa doida da história. É muito fácil achar que estamos certos o tempo todo, mas eu costumo reavaliar minhas convicções com frequência. Eu particularmente até gosto de entrar nas discussões já achando que estou errado, pra que outros me convençam. Mas dessa vez é diferente. Eu vivi isso. Eu li as notícias, as atuações constrangedoras do presidente, o total descaso com a pandemia, os preços subindo diariamente. Eu vi isso tudo porque dessa vez eu estava prestando atenção. Mas e quem não estava?

Droga, fiz de novo.

Eu acho que eu não sou a pessoa mais indicada pra estar ali na frente da guerra, sabe. Quem vai dar paulada, queimar carro, descer bolsominion na bicuda. Me falta personalidade. Por mais que eu realmente acredite nisso de ouvir o outro lado, eu imploro para que alguém me dê dois tapas na cara se eu ousar abrir a boca pra dizer isso novamente. E eu tô avisando porque eu sei que vou falar. Me mantenham em cativeiro, só me soltem pra votar no Lula no dia 30. NÃO OUÇAM NADA QUE EU DISSER. Não é o momento. Façam o que precisa ser feito. Não é a hora de gente galera agora, depois a gente resolve isso.

Porque eu acho que já entendi que essa dinâmica da empatia só funciona se o outro lado estiver com essa mesma abordagem. Do contrário, enquanto estou aqui dando terceiras chances, eles estão tomando o Brasil, fazendo atrocidade atrás de atrocidade. Acho triste, mas de fato nunca fizeram revolução com flores. Aquele princípio lá de que não dá para ser tolerante com intolerantes.

Eu só sou fraco. Reconhecer é o primeiro passo, eu acho. Vou conversar isso com a psicóloga.


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Acho que todo mundo concorda que ciúme é uma coisa ruim. Tem aquelas pessoas que acham que um pouquinho de ciúme é saudável e até recomendável, mas elas provavelmente cheiram cola e acessam a deep web. Agora aqui pensando rápido, não consigo imaginar vantagem alguma em se corroer por dentro por sentir que sua pessoa amada prefere outros a você. É uma energia muito mal gasta porque não conseguimos transformar em nada que preste, porém, entender que é ruim não faz o ciúme desaparecer magicamente, o que é uma pena.


Vou ignorar casos de violência para evitar pesar o assunto, mas tem essas duas fofocas que acho o ÁPICE do ciúme:

O cara era casado e tinha uma amiga do trabalho com quem ele sempre conversava pelo whatsapp. Acho que existe uma linha muito tênue entre amizade e flerte, e ele e essa amiga estavam sobre essa linha, mas nunca avançaram. Apenas risadas, memes, umas fotos inocentes aqui e ali, nada demais. Mas conversavam todo santo dia, até nos finais de semana e feriados. A mulher dele odiou quando descobriu. O que ela fez? Deu uma de doida e jogou o número da amiga dele pra um monte de pervertido num site qualquer da vida aí. O marido morreu de vergonha, mas cortou o papo com a amiga.

Também teve uma conhecida minha que teve que excluir todos os homens das redes sociais dela quando começou a namorar. Até eu rodei. Quando questionei o motivo, ela disse que o namorado mandou. Fiquei muito chocado. "Você não acha isso meio doentio?". A resposta: "Nah, normal, até porque primeiro eu pedi pra ele excluir todas as mulheres das redes dele".


Uma parte minha ouvindo esses contos de terror fica MEU DEUS, QUE DESGASTE EMOCIONAL, mas a outra... Gente, eu sou uma pessoa que pensa demais e, ainda mais agora que tenho um marido, eu acho que entendo a lógica do ciúme. Tenho que confessar que essas pessoas estão certas em defender os seus. Se vale a pena no fim das contas, já são outros 500.

Porque, pensa, eu pelo menos acho assim, não existe essa coisa de alma gêmea, não existe aquela pessoa única que é perfeita pra você, o amor da sua vida, que, se ela morrer, acabou amor pra você. Pensando na quantidade de pessoas que existem no mundo, NÃO É POSSÍVEL que só tem UMA que pode te fazer feliz. Dito isso, você pode encontrar pessoas para estarem num relacionamento com você quase em qualquer esquina a qualquer momento. O mesmo vale para a pessoa que você ama. Meu marido com certeza conhece centenas de caras mais bonitos do que eu. Alguns mais engraçados, mais legais, outros com mais dinheiro, com mais interesses em comum, com mais todas essas coisinhas que a gente conta num relacionamento. Mas só eu sou a combinação de características que ele escolheu pra namorar e casar com ele. Isso porque, TALVEZ, ele ainda não tenha conhecido alguém que encaixe melhor. E talvez jamais irá conhecer. Poder ser que essa terceira pessoa more na Índia e ele jamais pise lá. Azar o dela.    

Daí dá para entender essas pessoas doidas de ciúme que impedem suas pessoas de conhecerem outras, porque essas outras podem mesmo ser o novo amor da vida do seu amado. Quem sabe? É tudo questão de não permitir esses encontros. Se eu soubesse que a melhor pessoa pro meu marido mora mesmo na Índia, será que eu iria sugerir esse país como destino de uma viagem nossa?

***

Outro dia descobri uma série no streaming da Amazon chamada Soulmates. É dessas que cada episódio é uma história diferente, mas todos giram em torno do mesmo assunto: uma empresa desenvolveu um teste que informa com 100% de precisão quem, no mundo inteiro, é sua alma gêmea. Achei uma delícia, tem de tudo: Romance, terror, aventura, gays a rodo, trisais, mas principalmente DRAMA. Maravilhoso ver quando uma pessoa casada fazia o teste, e dava que a alma gêmea dela obviamente não era o cônjuge. O que a gente faz com uma informação dessa? Larga o marido e vai para o outro lado do planeta? Finge que o teste nunca existiu? Fica se perguntando pro resto da vida como seria viver com sua alma gêmea? Sofri em cada minuto, recomendo.



***

Impedir seu par romântico de conhecer pessoas é uma estratégia que funciona pontualmente e você de fato pode estar garantindo a longevidade do seu relacionamento, mas, gente, o mundo inteiro. O mundo inteiro de gente. Excluiu os homens todos do Instagram, beleza, mas e na vida real? E os colegas de trabalho? E os homens nos ônibus? E os amigos? E o dentista dela? Legal que cortou a amizade do marido com a fulana, mas e todas as outras mulheres do mundo offline e online? Como manter em calçadas diferentes pelo resto da minha vida meu marido e os homens mais bonitos do que eu? 

Alimentar nosso ciúme é um trabalho sem fim, apenas desempregados conseguem.

Eu particularmente acho que não vale o esforço. Pra mim, é mais fácil contar com a sorte. Se meu marido conhecer um cara mais legal, o que eu posso fazer? Parabéns, vá pela sombra.

PS: Esse texto é uma versão revisada e atualizada do que antes foi publicado no meu falecido blog pessoal, o Não Sei Lidar.

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Vocês sabem que eu escrevo livros, né? E acho que eu escrevo porque, antes, sempre fui de ler. Tem muita gente que não curte uma boa leitura, e eu entendo a maioria dos motivos, mas livro pra mim sempre foi uma arte muito fácil. Não precisa de um manual de instrução. Você pega o livro e lê. A sua bagagem emocional vai te guiar por um caminho que pode ser diferente do caminho que eu vou percorrer com o mesmo livro, mas em algum lugar você vai chegar. Então, para mim, isso já basta. 


Vale o mesmo para filmes, séries, enfim, narrativas, sabe? Artes desse tipo são autoexplicativas (tirando aqueles filmes ruins que você tem que ir na internet entender o final - ou eu que sou burro?). Você lê, assiste, consome e, se tudo der certo, entende. A arte imediatamente te causa algo. Pode ser algo legal ou desagradável, você pode gostar ou não, mas ela fez o que veio fazer e vida que segue.

Quadros não são assim. Pinturas, esculturas. 

Na maioria das vezes, não contam história nenhuma nem precisam ter significado algum. Eles apenas são. Parece super profundo dizer isso, mas é justamente o motivo pelo qual nunca consegui me conectar com esse tipo de arte. Juro pra vocês, pode ser o romance mais bobo que for, mas um livro sempre está dizendo alguma coisa. A pessoa que escreveu pode até nem ter noção, mas o livro está falando. Na construção dos personagens, no rumo da história, nos diálogos, no desfecho. O leitor pode até achar que está passando ileso por um livro, mas ledo engano. Agora, por uma pintura? Às vezes aquela cesta de frutas é só uma cesta de frutas mesmo. Aquela maçã não significa a derrocada do capitalismo. A banana não é a depressão do pintor. Nossa, por que será que a artista fulana pintou o céu de verde? Uma crítica ao status quo? Não, gente, acabou a tinta azul naquele dia. É tipo isso. Mas aí é que tá: não é sempre assim. Há várias artes plásticas cheias de críticas e dores e dramas e histórias por trás, mas às vezes é simplesmente muito difícil diferenciar, ainda mais quando você começa a entrar na arte contemporânea.

Isso tudo só para dizer que até então eu nunca tinha apreciado um quadro de verdade. Minha sensibilidade artística sempre foi dizer "Nossa, esse rosa combinou com o azul, amei", mas só. Já vi gente chorando na frente de um pintura ou então contemplando uma obra de arte por vários minutos, hipnotizados, aí, quando eu fui olhar, era um troço que pareciam ter feito de má vontade e ainda derramaram café em cima. Eu não entendo, sabe. Eu sou a pessoa que vai em museus e pensa "Ué, gente, um monte de móvel velho? Quem vai querer ver isso?". Tenho toda uma birra com museus e galerias de arte em geral porque acho que eles não se esforçam o suficiente para entreter o público, como fazem por exemplo um cinema ou, sei lá, uma vitrine de shopping. Eu deveria ir preso só por publicar essas opiniões, né.

Aí meu marido comentou que queria passar nossas férias numa cidade cheia de museus.


Belo Horizonte foi a escolha óbvia por vários motivos: 1) É uma cidade muito bonita, e eu e Arthur temos esse desejo de conhecer cidades bonitas 2) É perto do Rio de Janeiro, onde a gente mora, então é um lugar que nosso orçamento de férias alcança 3) Belo Horizonte era alvo desse comentário MARAVILHOSO que a gente encontrou num blog de viagem que publicou sobre o que fazer na cidade:

Transcrição do comentário do Gleyson: "A pior capital para se visitar,nada que realmente seja interessante, geografia péssima,onde faz de uma caminhadinha uma experiência aflita O que salva é a culinária, mesmo assim sabendo garimpar, transito caótico,motoristas ruim de roda,parece nunca ter frequentado uma auto escola"


Transcrição do comentário do Gleyson: "Moda cafona, a falsidade das pessoas parece ser o carro chefe, onde vc esta num roda de amigos, virou as costas pra ir ao banheiro vc vira o assunto… Ponto turístico principal uma lagoa, ou seja um esgoto a céu aberto, impossível ficar perto em alguns pontos, não se tem uma ciclovia que preste, transporte publico é uma vergonha,metrô nem se fala, melhor seria não ter de tão insignificante queé a linha…resumindo, não perca seu tempo e dinheiro vindo a bh"


Transcrição do comentário do Gleyson: "De Belo, o Horizonte não tem nada, a diversão é apenas bar, bar,bar,bar,bar e mais bar, se vc não é um alcoolatra, ai que fica sem opção de oq fazer mesmo". Abaixo, Larissa responde: "Gente???"

Gente, eu juro por tudo que é mais sagrado, eu CHOREI DE RIR lendo esse comentário, estou falando literalmente de LÁGRIMAS ESCORRENDO pela minha cara. FOI NO BANHEIRO VIROU ASSUNTO. A LAGOA É UM ESGOTO A CÉU ABERTO. MODA CAFONA. O que encerra com chave de ouro é o completo choque da dona do post que nem tem o que responder diante de tanta loucura: "Gente???".

A GENTE PRECISAVA IR PRA BH!!! E fomos. Deus abençoe Gleyson.

Abençoada seja também Larissa Vida Cigana, pois o post dela nos guiou dia e noite na cidade. Éramos nós quatro pra cima e pra baixo: Eu, Arthur, Gleyson e Vida Cigana. Qualquer mínimo morro que a gente subia, um de nós dois falava "Meu Deus, que experiência aflita". Cada Uber que a gente pegava, ficávamos na expectativa de ser ruim de roda ou do trânsito ser caótico. Todas as pessoas foram extremamente gentis com a gente O TEMPO TODO, mas graça ao Gleyson comentarista de portal sabíamos que a falsidade é o carro chefe do pessoal de BH, devia estar todo mundo falando da gente quando íamos ao banheiro. Tudo que dava errado, eu ficava "Gente???". Ai, que delícia de viagem.

***

O Gleyson deve ter um desafeto com museus muito maior do que o meu pra dizer que Belo Horizonte só tem bar, porque, gente, VÁRIOS MUSEUS. Ficamos lá cinco dias e dava para sortear em qual museu a gente queria ir. Eu poderia falar de todos aqui, mas sinceramente? Se você quer um roteiro de viagem sério, vá lá ler o blog da Vida Cigana, aqui eu só venho com a farofa. Então: O PIOR E O MELHOR MUSEU DE BH!!!

O PIOR MUSEU: Casa Kubitschek. É a casa em que o ex-presidente morou. Fica às margens da Lagoa da Pampulha O ESGOTO A CEU ABERTO, e a casa em si é, bem, uma casa. É o que eu já falei sobre museus, sempre fico com a impressão de que eles não se esforçam para me entreter. Lá na Casa Kubitschek, por exemplo, os cômodos estão lá de pé, legal, há meia dúzia de móveis aqui e ali, você entra num quarto e tem uma cama, um guarda-roupa, uma cadeira antiga num canto e é isso. Legal. Tá bom, gente, mas cadê a história? O que o Juscelino Kubitschek fez naquele quarto? Quem dormia ali? Cadê as fofocas? Não tem? Nenhuma? Pelo amor de Deus, inventem. Falem que foi nesse quarto que, sei lá, alguém morreu. Que fulano traiu cicrana. Que o bebê beltrano nasceu. Arrumem essas histórias e colem nas paredes, ENTREGUEM AO PÚBLICO ALGO MAIS QUE UMA CADEIRA VELHA. A Casa Kubitschek poderia ser a casa de qualquer pessoa. Vá lá se você quiser ver uma casa.

O MELHOR MUSEU: De longe, o Inhotim. Ah, mas ele nem fica em Belo Horizonte. Mas esse texto é meu. Escreve o seu aí. O Inhotim de fato fica na cidade de Brumadinho, mas eu e Arthur fizemos um bate-volta que valeu super a pena. O próprio lugar se proclama um "museu a céu aberto", mas, sinceramente, eu acho que só gostei porque não lembra em nada um museu. É na verdade um imenso jardim com uma ou outra obra de arte aqui e ali. Por mim, tudo bem. Tem muita arte contemporânea, algumas delas interativas, a maioria belíssimas. Entre as belíssimas também conto o homem pelado ao vivo e a cores exposto numa das galerias, Deus abençoe. Mas são os jardins que realmente tornam o tour incrível. Flores, árvores, plantas de vários tipos. Apenas um milionário entediado para fazer do quintal dele um centro artístico, está de parabéns.





***

Mas, no meio do caminho, uma exposição sobre a Nise da Silveira me impactou mais do que o pênis do moço no Inhotim. Para quem não sabe, como eu também não sabia, A Nise da Silveira era Deus. As religiões ao redor do mundo esse tempo todo completamente equivocadas. Gente, QUE MULHER. A Nise foi uma médica psiquiátrica que dedicou a vida todinha a humanizar o tratamento que os pacientes das alas psiquiátricas recebiam. Ela foi contra vários tipos de tratamento violentos lá pelas décadas de 50-70, tratamentos que hoje nós consideramos absurdos. As descrições são horrorosas. Mas a mulher não apenas tentou, ela foi lá e fez. Seria impossível resumir nesse texto tudo o que eu vi, mas até pra cadeia a Nise foi e lá dentro fez vários contatos que a ajudaram a expandir sua influência.

Numa das salas da exposição (vimos no CCBB da Praça da Liberdade!), vários quadros estavam sendo exibidos. Pois é, arte desse tipo que eu olho e fico "Ok, um quadro". Aquarela, óleo sobre tela, essas coisas. Eu não estava entendendo muita coisa, como sempre. Eram no geral pinturas retratando janelas coloridas e até aí tudo bem. Em algum lugar por lá estava escrito que a Nise pedia autorização para tirar alguns pacientes das alas e levar para o ateliê dela, para passarem o tempo pintando o que quisessem, uma espécie de terapia através da arte. O ateliê dela tinha um janelão, daí esse tanto de janela, a maioria dos pacientes pintava o que estavam vendo.


Lá estava o quadro do Emygdio de Barros, mais uma janela psicodélica, bem bonito até. Mas foi a notinha com uma fala da Nise ao lado do quadro que me quebrou:

"Eu o trouxe porque já faz dias que, quando vou buscar os outros que têm autorização, noto no canto do olho deste a vontade de vir também. Diante disso, baixei a cabeça. Saber ler no canto do olho de um esquizofrênico não é para qualquer pessoa, não. Nem psiquiatra, nem psicólogo, nem sábio de qualquer espécie. Em seguida, procurei o psiquiatra do Emygdio para dar uma satisfação da vinda dele para o meu ateliê. E ele me disse: – Se quiser autorização, eu dou, mas não adianta nada porque ele já está há 23 anos internado, em estado de decadência psicológica muito profunda, e não vai fazer nada que preste"

E daí o homem se transformou num dos gênios da pintura brasileira??? Gente, eu fiquei DESTRUÍDO. O quadro agora tinha todo um significado que eu não estava vendo antes. O quadro era praticamente um MILAGRE. O Emygdio de Barros internado há décadas, a galera tratando como se ele fosse uma pessoa sem valor nenhum, não dando nada por ele, só Deus sabe o que esse homem sofreu, pra chegar a Nise e dar uma chance. O quadro me deixou pensando tanta coisa! Imagina quanta gente talentosa deve existir por aí, mas NUNCA será descoberta. Imagina quantas pessoas só precisam de 1 chance, literalmente UMA, para revelar uma arte simplesmente necessária. A melhor escritora pode ser uma mulher que nunca publicou um livro. O melhor cantor pode ser um homem que nunca subiu num palco. A melhor bailarina é uma garota que nesse momento está trabalhando numa fábrica para levar comida para dentro de casa. O melhor comediante é um senhor muito feliz internado num hospital. É extremamente triste.

Em algum momento ali encarando o quadro do Emygdio, eu chorei.

Ainda não sei dizer se todo quadro tem uma história, mas às vezes eles dão com ela bem no meio da nossa cara.

***

BH é uma cidade belíssima, recomendo.



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Amo pular páginas. Sempre rola uma comoção quando dou a entender, casualmente, que meu hábito favorito de leitura é esse. Não sei se as pessoas me entendem. Não que eu queira me justificar, não tô aqui buscando o PERDÃO de ninguém, é que eu acho que quem não pula é que perde horrores. 


Entendo que pega mal. Quer dizer, eu leio desde sempre, tô falando de livros desde que vim capinar o matagal da internet, agora escrevo meus próprios livros e já fundei quatro clubes do livro. Muita gente me agradece por esse último trabalho, por eu ter ajudado a ressuscitar o hábito de leitura em quem tinha deixado os livros um pouquinho de lado. Pular páginas parece coisa de quem não gosta de ler ou de quem está lendo por obrigação e só quer chegar logo ao final para se ver livre da tarefa. Eu particularmente nem tenho nada contra quem faz isso, o livro é seu, pode ler de trás pra frente se quiser, mas não é por isso que pulo páginas.

Pulo para o livro ficar melhor. Pular páginas, pra mim, é melhorar a minha experiência de leitura.

Pessoal do clube do livro fica dizendo que eu deveria dar um curso. Não tenho essa cara-de-pau, mas na minha cabeça realmente existe uma técnica. Não saio pulando páginas aleatoriamente. Preciso primeiro sentir que posso pular aquela cena, aquele parágrafo, aquelas páginas. Não é qualquer página que dá para ser pulada, mas o processo é muito pessoal e só você vai saber quais páginas são boas para serem lidas. Vai muito do seu autoconhecimento enquanto leitor.

Eu tenho exemplos.

"Fangirl" é um livro da Rainbow Rowell, que é uma escritora que eu amo. Tudo que essa mulher escreve me encanta pelo jeito que ela usa as palavras. Nesse Fangirl, ela conta a história de uma menina indo para a faculdade, uma menina que escreve fanfics. Até aí tudo bem. O livro fica alternando os capítulos entre a vida da protagonista na universidade (as amizades dela, os relacionamentos amorosos, professores, dramas familiares etc) e as histórias que ela escreve. Sim, história dentro de história, que é um artifício que eu realmente odeio. Eu nunca fui muito feliz com livros nesse formato. Enquanto eu lia muito animado os capítulos da protagonista, quase morria para finalizar os capítulos da fanfic, que é uma história de fantasia, gênero que já não me apetece muito. Era até engraçadinha e tal, mas não acrescentava EM NADA à história original. Muito mal se conectava com a trama, eram páginas e mais páginas descrevendo cenas que, ao meu ver, eram inúteis. Bastava saber que a menina escrevia fanfics de uma série naipe Harry Potter. Pulei sem dó. Li o livro até o final, continuei amando a autora, Fangirl é um dos melhores livros dela, na minha opinião.


Outro caso foi com o "Por trás de seus olhos", da Sarah Pinborough, que foi escolhido como leitura da vez em mais de um clube meu. O livro fala do drama de uma mulher que se vê dividida entre a melhor amiga e o marido dessa amiga. Comecei lendo realmente muito curioso, a história é instigante, a escrita te leva longe. A protagonista entende que tá sendo fura-olho pegando o marido da amiga, mas está muito apaixonada pelo cara. E o casamento deles é todo esquisito mesmo, parece um relacionamento abusivo girando em várias direções. Aí notei um padrão. Toda santa vez que, por exemplo, o marido mandava uma mensagem para a protagonista do tipo "ei, vamo transar", ela ficava MAS NUNCA que vou fazer isso com minha amiga incrível, CHEGA DESSE HOMEM, aconteceu uma vez só sem querer, mas agora BASTA. Aqui eu tô resumindo. Mas eram umas cinco páginas da gente lendo os motivos que ela tinha para nunca mais chegar perto desse homem, para na última frase ela beber vinho, se chatear com a amiga por qualquer coisa boba e ficar QUER SABER? VOU DAR PRA ELE SIM. E aí ia. O tempo todo isso, gente. Às vezes ia na direção da amiga, às vezes na direção do cara. Mas era batata. Mil páginas falando que não ia fazer e, do nada, jogar tudo para o alto e fazer o oposto. Fiquei, meu deus, POR QUE ESTOU LENDO ISSO se logo em seguida essa DESGRAÇADA vai cagar para o que disse? Quando comecei a identificar que vinha a lengalenga de sempre, pulava até ela efetivamente fazer o malfeito. Nossa, a leitura voou. O final é muito surpreendente, ou você termina de queixo no chão ou ultrajado com a reviravolta. Adorei ter passado por essa experiência!

Deu para entender meu ponto? Eu só pulo páginas em livros que estou gostando. Evito páginas que considero inúteis ou só vão me irritar sem acrescentar nada de novo. Às vezes o livro é incrível, mas tem uma parte muita chata, eu corto ela da minha experiência. É como tentar salvar um legume meio podre. O que é ruim a gente corta fora, a parte que sobra a gente consome. Quando o livro é ruim como um todo, na minha opinião, aí eu nem avanço na leitura. Eu abandono. Tenho certeza de que, se eu tivesse tentado ler de cabo a rabo esses livros que citei, teria ou abandonado ou terminado com uma avaliação bem negativa. Sem contar as horas gastas lendo coisa chata.

Ah, mas tenho medo de pular e perder coisa importante. Se for importante, você volta, ué. Ninguém morre por isso. Mas, como eu disse, vai muito de você saber identificar o que faz sentido para você ler. Um fã de fantasia, que ama Harry Potter, por exemplo, provavelmente seria muito feliz lendo os capítulos da fanfic em Fangirl. Cabe a você decidir. Também não é sobre ser importante ou não para o enredo do livro. Tem livros com capítulos imensos e inúteis, mas que eu gosto de ler porque sim. A escrita é boa, as cenas são engraçadas, eu amo ver os personagens interagindo... Eu pulo o que eu sinto que não vou gostar. Como eu disse, há séculos que sou leitor, então tem muita coisa que já sei que não rola para mim: história dentro de história, personagens sonhando, cenas com personagens alucinando, gente perdida em floresta e alguns formatos repetitivos como rolou com o "Por trás de seus olhos".

Ah, mas o autor e o editor pensam muito bem em construir a narrativa, tudo que está no livro é importante. Assim... Eu concordo que quem trabalha no livro realmente se esforça para que fique o melhor possível, mas o conceito de melhor é muito subjetivo. Melhor para quem? A melhor forma do Fangirl pra mim seria ele sem os capítulos da fanfic. Obviamente a autora e quem editou o livro discordam de mim, e isso não é um problema. Pular páginas é minha forma de eu mesmo editar o livro para deixá-lo do jeito que me interessa. E, pelo amor de Deus, livros são escritos por pessoas, gente que erra, que toma decisões questionáveis, quantas vezes você não já leu um livro cujo final você odiou pois pareceu completamente incoerente com o resto da história? Nunca um livro vai ser publicado da melhor forma para todo mundo. Poder até ser a melhor forma para a maioria, mas para todo mundo não. Me sinto muito poderoso, cabe a mim mesmo fazer do livro a melhor experiência de leitura que eu puder.


Um exemplo que considero maravilhoso e que põe logo o prego no caixão dessa discussão é o Memórias Póstumas de Brás Cubas. Juro pra vocês que não estou faltando com a verdade, assim como fui ilibado ao demonstrar a subtrama homossexual em Dom Casmurro. Machado de Assis sempre a frente de seu tempo, ai, ai. Um dos capítulos do Memórias, não vou reproduzir com as exatas palavras, mas começa assim: "Olha, o capítulo a seguir é um grande delírio, então, se você quiser pular, pode, não acrescenta em nada". EU JURO, GENTE. E eu realmente odeio delírios!!! O AUTOR ME DEU O AVAL PARA SER FELIZ. Obviamente pulei. E vocês ainda nisso, ah, mas o autor quer que a gente leia tudo. Gente, o autor quer DINHEIRO, quer que você COMPRE O LIVRO. Depois de comprado você pode até botar fogo. Quem escreve também quer que você se CONECTE com a história, não importa como. Em outra parte do livro, eu senti que ia começar uma cena longa e desnecessária, então pulei o capítulo. Fiquei muito surpreso que o capítulo seguinte começa mais ou menos assim: "Eu sei que o capítulo anterior parece inútil, mas te garanto que não é. Se você pulou, te aconselho a voltar lá e ler". JURO DEMAIS, GENTE. Vocês que já leram Memórias Póstumas sabem que isso está lá! 

Então, assim, até o Machado de Assis sabia que tudo bem pular as páginas certas. Algumas precisam ser lidas, outras não necessariamente. O livro é seu, a experiência é sua, faça o que for melhor para você. Fico me perguntando o tanto de livro que vocês odiaram e que poderiam ter sido muito mais divertidos fazendo os cortes certeiros. Dê seus pulos! Se um dia eu montar um curso, vocês saberão.


PS: Esse texto é uma versão revisada e atualizada do que antes foi publicado no meu falecido blog pessoal, o Não Sei Lidar.


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Todo mundo já sabe mais ou menos o que esperar quando começa a ler Dom Casmurro, do Machado de Assis. Quando meu clube do livro escolheu essa leitura no ano retrasado, já imaginei todo um debate gostoso sobre o bom e velho Capitu traiu ou não traiu. Sabe o que eu não esperava? Um tórrido romance LGBT nas entrelinhas e, principalmente, nas linhas.


Eu não tô brincando, gente. Sei que nesse blog faço piada com tudo, mas o subtexto homoerótico entre Bentinho e Escobar é real. Tudo começou com esse meme aqui:


Quer dizer, eu achei que fosse um meme, mas é toda uma teoria embasada nas pistas escondidas por Machado à espera do gay certo. Quanto mais eu ia lendo, mais ficava Nossa. Eita. Rapaaaaaaz. Juro pra vocês, a tensão sexual nas páginas de Dom Casmurro me balançou mais que os últimos romances gays que li. Chegou certo ponto do livro, eu não estava mais nem aí pra saber quem era Capitu, afinal nem se quisesse ela conseguiria alguma coisa com Escobar, que só tinha olhos para o Bentinho.

"Os padres gostavam de mim, os rapazes também, e Escobar mais que os rapazes e os padres"

Isso é quando Bentinho começa a contar como foi a adolescência dele no seminário, que é um colégio católico que forma padres, obviamente só para meninos. Assim... ATÉ AÍ TUDO BEM. Ele acabou de conhecer o Escobar e, de repente, já são grandes amigos. Até que vem essa confissão:

"Escobar, você é a pessoa que mais me tem entrado no coração"

"Bentinho, a verdade é que não tenho relações com ninguém aqui, você é o primeiro e creio que já notaram, mas eu não me importo com isso"

Logo em seguida, eles são repreendidos por um padre porque se abraçaram no pátio. O padre diz que eles não precisam demonstrar tanto afeto assim, "podem estimar-se com moderação". A solução dos dois amigos é dar as mãos às escondidas, longe dos olhares indesejados.

Eu não sei por que gastei minha adolescência inteira indo numa igreja evangélica se toda diversão acontece nos seminários católicos.

Ok que vocês podem achar pouco, mas eu não acabei. Amo a parte em que o Escobar conhece a mãe do Bentinho e percebe que ela é muito bonita.

"Está muito moça e bonita! Também a alguém há de você sair"

Meu deus, gente, que flerte sutil. Ao mesmo tempo em que Escobar elogia a mãe, encaixa rapidamente um elogio à beleza de Bentinho.

MANDARAM ISSO NO GRUPO DO CLUBE e achei pertinente

Existem outras passagens menos reveladoras, mas que carregam muito potencial quando lidas com os olhos certos. Quando Bentinho pergunta, irritado, por que Escobar não foi jantar na casa dele, e o segundo rebate que não foi convidado, para ouvir um "E precisa???". Ou as inúmeras vezes que Bentinho deixa claro que a opinião de seu amigo hétero Escobar é tudo que ele precisa ouvir. Ou ainda quando Bentinho APALPA os braços de Escobar, como um gay clássico, e diz "Nossa, que braços de nadador!"

De qualquer forma, porém, o detalhe que deixou minhas pernas bambas é o porta-retrato sobre a mesa do escritório do Bentinho com uma foto do Escobar. Isso mesmo, nosso protagonista trabalhando o dia todo olhando para a foto de seu grande amigo, como todos nós fazemos. Nenhuma menção a outras fotos, nem da Capitu, nem do filho, nem da mãe... Mas tudo bem! Intrigante inclusive que a foto foi dada pelo próprio Escobar como um presente. Não é uma foto deles juntos. Não é uma foto das famílias, não é um grupo de pessoas que por acaso inclui o Escobar. Não. É uma foto EXCLUSIVAMENTE DO ESCOBAR. Posando para a câmera. Não bastasse tudo isso, ainda vem com uma dedicatória:

"Ao meu querido Bentinho, do seu querido Escobar"

COMO É LINDO HOMENS QUE SE AMAM NA CAMA COMO AMIGOS!!!

Eu encerro meu caso aqui.

PS: Esse texto é uma versão revisada e atualizada do que antes foi publicado no meu falecido blog pessoal, o Não Sei Lidar.


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Eu tenho um problema seríssimo com listas de Melhores do Ano: quando exatamente essa lista foi feita? Bate outubro e já tem gente listando os seus favoritos, entregando troféu e tudo. Amiga, se acalme, o ano não acabou, mesmo que o nosso corpo clame por isso. Eu não consigo, sabe? Sempre fico com a sensação, com a pontinha de esperança, sei lá, de que nos últimos dias de dezembro eu vou ler um livro inesquecível ou escrito por uma pessoa maravilhosa que vai fazer parte das minhas leituras para sempre, e por conta disso seria uma GRANDE INJUSTIÇA montar uma lista de melhores sem essa obra-prima. Eu de fato comecei a ler um livro HILÁRIO em dezembro de 2021, mas terminei? Não terminei. Fica aí pra lista de 2022. O ponto é que minha lista nunca sai no ano do qual ela pertence, e é por isso que estamos aqui em janeiro ainda falando de um ano que quase todo mundo quer esquecer.

Poxa, gente, mas livro é livro, né? O que de bom eu li ano passado pode ser sua luz e seu conforto esse ano se você sabe que nossos gostos combinam.


Em 2021, segundo o Skoob, eu li 38 histórias. Digo histórias, porque aí no meio vão contos, novelas e romances. Aqui na minha lista, não fiz distinção. História boa é história boa. Outra coisa é que eu me considero uma pessoa muito exigente no que diz respeito a livros, então essa aqui não é a lista das histórias que eu li e gostei, é de fato a lista das que eu considerei as melhores das melhores. Eu poderia citar vários outros livros bons que li esse ano, mas esse texto ficaria três vezes maior.

Dito isso, em nenhuma ordem específica, VAMOS AOS MELHORES DO ANO!

(Ah! Todos os links pra Amazon nesse texto são do programa de afiliados, o que significa que eu ganho comissão se vocês comprarem qualquer coisa através deles)

Os sete maridos de Evelyn Hugo (Taylor Jenkins Reid)

Eu sei, eu sei, indicação de pessoa BÁSICA. Apenas um dos livros mais vendidos do BRASIL. Eu sou uma pessoa lerda em diversos sentidos e não seria diferente na leitura: quase nenhum livro dessa lista foi lançado em 2021. Tudo é dos últimos cinco anos. Bom, azar do Felipe de 2019 que não leu "Os sete maridos de Evelyn Hugo" da Taylor Jenkins Reid quando estava no hype porque o Felipe de 2021 aproveitou horrores. É divertido, é bem escrito, é cativante! O lance desse livro é que ele tem diversas frentes e é muito difícil resumir a história dele numa sinopse só. A parte que mais me tocou na história (a relação da Evelyn com o Harry) e fez eu dar minha alma todinha pra Taylor Jenkins nunca nem me disseram que existia no livro, então assim... É um drama. Tem romance, tem bastidores de Hollywood, tem pessoas não hétero sendo muito bem representadas no papel, sirva-se à vontade. Valeu demais o hype que teve.


Não preciso mentir: peguei "Sangue & Circuito" do Marco Barbieri para ler exclusivamente pelo homem gostoso na capa. Eu estava na vibe "vamos descobrir o que os gays adultos escrevem" e, gente, se eu cheguei pela safadeza, foi o suspense e a tensão constantes que me fizeram ficar. As cenas de sexo são de fato gostosíssimas, MAS TÁ BOM, MINHA FILHA, ME FALE DOS ROBÔS!!! Eu precisava saber das inteligências artificiais, quem estava por trás das tretas, quais os motivos, como os protagonistas iam conseguir sair vivos disso tudo. O livro levanta questões sobre a vida humana que eu fiquei refletindo, é simplesmente tudo de bom. Assim... Definitivamente não é o livro pra você que está procurando apenas um romance erótico rapidinho para se entreter, pois "Sangue & Circuito" é uma ficção científica com pitadas de erotismo que vai dar um nó na sua cabeça e tem mais de 500 páginas. O livro infelizmente não está mais disponível em lugar nenhum no momento, mas tenho fé que em breve volta pra Amazon. O livro agora está disponível no site/aplicativo Buenovela!


Encontrar "Mensagens para ler no escuro" da Beatriz Montenegro na Amazon foi como achar um TESOURO no meio da lama porque, Jesus Cristo, tem muito livro erótico ruim. Por "ruim" eu quero dizer porcamente escrito, de um jeito que não deveria estar nem ali, livros que não fazem jus ao gênero. Então chega uma hora que a gente cansa de procurar. Mas então vem esse livro que na verdade são 3 contos perfeitinhos com romances eróticos entre meninos. As três histórias equilibram muito bem as cenas fofas com a pegação, e de um conto para o outro o nível de hot vai aumentando. Achei as cenas explícitas muito bem narradas e sensuais, não teve nada daquele cafona que geralmente me faz rir em livros do gênero. Recomendo demais.

O "F5" do João Luiz é o famoso "o ruim é que acaba". Foram as 18 páginas mais bem aproveitadas que eu já li. Sim, é um conto. E aqui dá pra sentir quando a pessoa escreve um conto sabendo que está escrevendo um conto, querendo escrever um conto. F5 aprofunda os personagens de um jeito que muito romance de 300 páginas não consegue fazer. A gente fica "Meu deus, eu preciso saber mais desses dois". É um drama, é um romance, tem a tensão que dura o conto inteiro da gente querendo descobrir se eles vão passar ou não no vestibular e o que isso vai significar para o futuro dos dois. A gente lê querendo economizar cada palavra, mas é impossível. Eu adorei esse conto. Graças a Deus, já tiveram a decência de publicar o João Luiz e um romance dele saiu pela editora Caligari em 2021! Com certeza lerei, vamos torcer para que em 2022. 

***

Uma orientação que sempre dão quando vamos começar a planejar nosso livro (como vai ser a capa, quanto vai custar, o que vamos escrever na sinopse etc) é montar uma lista de livros já publicados que achamos similares ao nosso. Chamam de COMP LIST (Lista de comparação). Isso porque essa lista vai nos ajudar a entender as tendências do mercado e agregá-las (ou rejeitá-las) ao nosso livro. Realmente ajuda bastante. Daí que quando fui montar a comp list para Gay de Família... entrei em pânico. Ficou vazia. Fazia tempo que eu não lia outro livro com as mesmas características que o meu. Comédia adulta LGBT+ que não gira em torno de um romance, no caso. Tive que ir afrouxando os critérios e fui lembrando de alguns títulos. Confesso que até hoje tenho dificuldade de encontrar pessoas nas quais me espelhar, do tipo essa pessoa escreve exatamente pro mesmo nicho que eu, mas fiquei muito feliz de encontrar Renato Ritto e Lucas de Almeida no meio da caminhada.


Gente, por favor, LEIAM BRILHANTE. Eu acho que para todos os livros dessa lista eu tenho um porém do tipo "Eu amei, MAS se você não gosta de tal coisa talvez não vá gostar". MAS ESSA DAQUI é a história universal. É um conto de 46 páginas muito rapidinho. Uma comédia romântica realmente engraçada em que um funcionário envia acidentalmente para o chefe um e-mail muito do desaforado. Eu literalmente URREI com esse e-mail. Acredite em mim, você merece esse urro na sua vida.

"De férias com meu ex", novela do Lucas de Almeida, de tudo que eu li esse ano foi o que mais se aproximou do que eu escrevi em Gay de Família. É uma comédia RAIZ, sabe? Não é sutil. É uma piada por linha, são cenas constrangedoras, personagens caricatos, situações absurdas, ai, gente, tudo que eu amo. Mas, aquilo, não se enganem. Por baixo de quase toda comédia, vem ele, o DRAMA. É uma história adulta, e o dilema chega a ser dolorido. Estamos lá rindo, mas chega uma hora que a gente fica eita. Então prepare-se!

***

Aqui eu preciso roubar um pouco porque meio que não quero indicar só histórias, mas quero indicar pessoas. Entendam como o meu troféu PESSOAS DO ANO.


Quem me conhece sabe o quanto eu sou resistente a dramas, minha apatia com poesias e com histórias dentro de histórias, daí vem a Marina Feijóo com o livro "O centro de todo o caos" que tem tudo isso e... me conquista. Mas meu problema com dramas, na verdade, só existe com os dramas ruins. Quando eu vejo um autor/editora anunciando livro com "NESSE AQUI VOCÊS VÃO CHORAR" já sei que o livro é forçadíssimo ou arrastado toda vida. Fico pra morrer. O livro da Marina é um drama de uma perspectiva tão realista que eu fui lendo sentindo que poderia estar acontecendo com qualquer amiga minha. A protagonista é depressiva, sim, mas nada no livro é uma grande tragédia, apenas a vida como ela é. Tem drama, tem alívio cômico, tem foco em amizade, não gira em torno de romance (mas tem romance também!), a protagonista é lésbica, achei muito responsável ao falar sobre saúde mental e é ágil feito uma flecha.


Troféu PESSOA DO ANO pra Marina porque adorei conhecer o trabalho dela em 2021 e ver florescer, já que, além desse livro, outros dois trabalhos dela também foram publicados. Marina Feijóo é uma escritora à la carte: "O pior pesadelo de um homem" e "Essa festa virou um slasher" são contos de fantasia e terror, respectivamente, ambos já na minha lista de leituras futuras.


Gente, não é de hoje que ouço o nome de Stefano Volp na boca do povo e com meu clube do livro já apoiei alguns dos projetos literários incríveis que ele organiza no Catarse, mas foi só em 2021 que eu de fato li as palavras que ele próprio escreve. Stefano Volp é fenomenal. "Homens pretos (não) choram" é uma coletânea de contos que eu com tranquilidade consigo ver nas mãos de todo mundo, seja você um homem negro ou não. Se você tem um pai, um marido, um irmão, um filho, um homem qualquer que seja importante na sua vida, talvez esse livro seja muito interessante para essa relação. Os contos são dramáticos, divertidos e inventivos. Foi um livro que me valeu cada linha, mas eu nunca nunca nunca nunca nunca vou me esquecer dos contos PIO e BARBA. Volp, entre em minha casa e faça a barba de toda a minha família! A coletânea ainda está disponível na Amazon, mas já vai ser relançada pela Harper Collins NESSA SEMANA, então vale a pena esperar pela nova edição física! O livro já ganhou uma nova edição lindíssima pela Harper Collins, com contos inéditos e capa dura. Tudo de bom!

Nova edição

Edição antiga

Troféu PESSOA DO ANO porque, gente, Stefano Volp não para! O homem é dono de uma editora, clube do livro, sai em coletânea, lança e-book, lança livro, escreve roteiro pra série da Netflix, escreve coluna pra jornal!!! Graças a Deus. Merece mesmo todo sucesso do mundo. O Volp é uma pessoa que vale a pena ser seguida no Twitter e/ou no Instagram porque TODA SEMANA tem uma novidade pra deixar a gente feliz.


Fico até meio sem graça de falar isso, mas... Como vou explicar... 

Nesse esquema de avaliar com estrelas as minhas leituras, eu dou 3 estrelas para todos os livros que eu gosto, 4 estrelas para os meus favoritos, mas 5 estrelas apenas para DEUS. Em 2021, a única história que levou as minhas 5 estrelas foi o conto "Escrito em algum lugar" do Vitor Martins. Sim, Vitor Martins é Deus. E isso eu sei desde o primeiro livro que li dele, lá em 2017. 

É sério, gente, outra coisa que digo com tranquilidade, sem nenhum exagero: hoje na ficção adolescente nacional não existe NINGUÉM que eu tenha lido que escreva tão bem quanto Vitor Martins. Se lendo as histórias do Renato Ritto e do Lucas de Almeida eu senti que finalmente podia pertencer a algum lugar, lendo o conto do Vitor eu fiquei "Caramba, eu tenho tanto a aprender...". O conto é uma aula. É genial. E aqui eu não falo exatamente só do conteúdo, sabe? Porque ideias e sentimentos todo mundo tem, eu tenho, você também, etc, mas a sabedoria em escolher as palavras certas na ordem certa só um bom escritor. A escrita do Vitor Martins traz uma qualidade que se destaca muito, de um jeito que eu me sinto compelido a querer ler qualquer coisa que ele vier a escrever, seja ficção adolescente, adulta, não-ficção, receita de bolo, resenha de filme, manual de instrução, tudo MESMO. Um exemplo prático do conto "Escrito em algum lugar" é que no meio da história aparece uma thread do Twitter, simplesmente um momento hilário, por conseguir representar tão bem o espírito da rede social. Um escritor menos experiente jamais conseguiria obter o mesmo efeito, ficaria sem graça e forçado. Eu mesmo nem chegaria a tentar. Mas Vitor foi lá e fez.


Troféu PESSOA DO ANO também, pelos prêmios internacionais chiquérrimos que ele ganhou e também pelo livro novo que lançou aqui no Brasil, "Se a casa 8 falasse". Ainda não li esse último, mas eu tenho esse combinado comigo mesmo de sempre ter um Vitor Martins no mundo me esperando para ser lido, é uma sensação muito boa saber que tenho para onde voltar quando eu quiser.

***

PLOT TWIST! Apesar de toda a rasgação de seda acima, eu tenho um livro do ano e não é nenhum desses que citei até agora.


Eu nunca em toda minha vida li um livro parecido com "A palavra que resta" do Stênio Gardel. Não é um livro que todo mundo vai amar, vai ter gente que vai odiar, vai ter gente que literalmente não vai saber ler. A história do livro é uma coisa, o jeito que o autor decidiu contá-la é outra coisa. Se você se der bem com as duas, como eu me dei, esse livro será um primor para você. Gente, QUE EXPERIÊNCIA, sabe? Eu fico sempre chocado com esses livros curtinhos (152 páginas esse aqui) que com tão pouco conseguem fazer tanto. É a história de um senhor que recebeu uma carta do amor da vida dele quando eram jovens, mas ele não sabia ler na época. Agora, já velho, ele decide aprender a ler só para saber o que há escrito na carta. Mas a história é dolorida toda vida, porque é sobre ser LGBT no interior do interior e meu Deus... É tão belamente escrito e ao mesmo tempo tão horrível! A pontuação faltando, as frases truncadas, o fluxo de pensamento pesadíssimo. No começo, a gente realmente se perde até se acostumar com a narração do protagonista, mas, pelo menos para mim, a coisa passa a funcionar maravilhosamente bem. Os personagens ficam marcados na memória pra sempre. Coitado do Stênio Gardel que vai ter que escrever um livro depois desse.

É meu livro do ano SIM, é uma grande contradição SIM pois eu indico com várias ressalvas, mas fico na torcida para que você se interesse e tenha uma experiência tão boa quanto a minha. Cadê o Jabuti e o Nobel da Literatura pra esse homem, gente?


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É isso! Espero que vocês tenham curtido a lista! Se já leu algum desses, me deixa saber sua opinião? Se não conhecia, algum chamou sua atenção? Algum livro ou nome pra indicar para 2022 agora conhecendo mais ou menos o que gostei de ler no ano anterior?

Boas leituras pra gente!


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