Se eu falasse que não tenho nada contra alguns crentes, estaria mentindo. Tenho até várias coisas contra, mas acho que nem são tantas assim como vocês talvez pensem. Até tenho amigos que são. Tipo, eu literalmente tenho amigos que são. E foi com um desses amigos que esses dias eu estava conversando sobre ter filhos. Ando falando muito sobre sobrinhos na internet ultimamente por causa do lançamento de Gay de Família, mas ser pai foi um assunto que sempre me interessou.


Nossa, então você quer ter um bebê?

Não, gente, não assim. Primeiro, vamos aqui estabelecer que quando eu falo de mãe/pai eu estou falando de quem cria e cuida da criança, tá? Pai de Instagram não conta. Se você é tio, avó, irmão, babá, primo, professora, enfim, responsável pela criança, é de você que eu estou falando.

Eu às vezes fico pensando o que eu faria em determinadas situações se o pai fosse eu. Um pai hipotético, digamos assim. Eu sinceramente acho que não levo o menor jeito para cuidar de uma criança. Brincar, mimar, tomar conta por alguns dias é uma coisa, agora se responsabilizar por vários anos da vida de um ser humano é outra bem diferente. Meu amigo estava dizendo como deve ser maravilhoso sentir por outra pessoa esse AMOR MAIOR & SUPERIOR que te faz querer proteger seu filho A QUALQUER CUSTO o TEMPO TODO, os olhos dele brilhando, o sorriso no rosto... Não dou 6 meses para ele e a esposa aparecem com um bebezinho na barriga. 

Lindíssimos os dois, mas, assim, gente... Eu acho que esse negócio de querer ter filhos simplesmente vem de dentro, sabe? Ou a pessoa quer ou não quer. A gente até pode mudar de ideia com o tempo, com nossas experiências, mas essa vontade de ter bebês, para mim, não é exatamente lógica. Acho debates nesse sentido totalmente infrutíferos, essa coisa de ficar tentando convencer as pessoas a terem ou não filhos. Porque, enquanto meu amigo entende a frase "querer proteger seu filho A QUALQUER CUSTO o TEMPO TODO" como amor, eu leio como um completo pesadelo.

Como que se vive preocupado com alguém 24h por dia, pelo amor de Deus?

Realidades assustadoras pra mim. Deixar minha filha ir para escola e eu ficar sem saber como estão tratando ela por lá. Meu filho atravessando uma rua. Minha filha praticando um esporte radical. Meu filho doente. Minha filha se metendo numa briga. Meu filho no meio de um acidente grave. Minha filha cometendo um crime. Meu filho indo para um lugar que eu mesmo nunca fui. Minha filha virando fã de Harry Potter. Essas coisas.

Não que eu concorde com eles, mas eu entendo de onde vem a mania de pais superprotetores. Tenho pra mim que existe alguma coisa no cérebro humano que desliga esse terror que pais deveriam sentir o tempo todo, porque realmente não tem como.

É engraçado que, quando eu era criança, assistir filmes da Sessão da Tarde sempre foram altas aventuras, mas, em retrospecto, agora eu percebo que toda aventura infantil é um pai ou uma mãe virando . As crianças SOMEM POR DIAS. São sequestradas. Levadas por monstros gigantes para outros mundos. Elas próprias se transformam em monstros. Encolhem. Ficam invisíveis. Voam. Enfrentam bandidos, robôs, fantasmas, demônios, outras crianças igualmente perigosas. GENTE!!!

Eu dando esporro em todas as criaturas mágicas no final dos filmes: NÃO ERA PRA TER LEVADO MEUS FILHOS SEM MINHA AUTORIZAÇÃO, PORRA. VOCÊ É UM BOI MÁGICO SEM NENHUMA RESPONSABILIDADE, SE ACONTECE ALGUMA COISA QUEM PAGA O PATO SOU EU. ARRUMASSE OUTRA PESSOA PRA SALVAR O MUNDO, ELES SÃO CRIANÇAS!!!

Aí meu amigo vem falar de amor superior. Pra quê eu quero isso, gente? Numa viagem bem quando eu e Arthur nos conhecemos, eu inventei que queria andar a cavalo pela primeira vez. Lá fomos nós: eu num cavalo, ele em outro. Do nada eu percebi que o cavalo dele estava se enroscando numa corda e visualizei todo o acidente: ele caindo e quebrando o pescoço. Fiquei em pânico. E eu não podia fazer nada, né. Quase gritei MOÇO, SALVA MEU HOMEM, mas saiu algo similar. A gente nem namorava ainda. O instrutor que estava com a gente correu, desenrolou a corda depois do meu grito e ninguém morreu. Eu nunca mais vou deixar meu marido subir num cavalo, sabe? Foi horrível querer proteger alguém a qualquer custo. Eu senti uma fração do tal amor maior e não recomendo. Se fosse meu filho, ah, gente, não sei como, mas eu daria meu jeito. Eu seria o cavalo, eu seria o instrutor, eu seria a corda, eu seria até você que está me lendo.

O sorriso no rosto de quem salvou um homem

Hoje eu posso dizer que minha vida é até bem tranquila. O último grande desespero que eu vivi foi que deu problema no gás do prédio e agora estou tomando banho frio todos os dias. Sempre que alguém me pergunta por que não penso em ter filhos, eu digo que até penso, criança é tudo de bom, mas Deus me livre criar um potterhead.