Eu adoro clichês. Acho até que quem diz que não gosta está equivocado, porque clichês na ficção estão por toda parte. Você pode não gostar de alguns clichês específicos, mas é meio impossível um filme, uma série ou um livro não usarem de uma fórmula consagrada para alcançar o sucesso.

Já perdi a conta de quantas meninas esbarraram em meninos na escola, derrubaram livros no chão e se apaixonaram logo em seguida. Ou de quantas vezes a filha do presidente dos EUA foi sequestrada e um cara teve que ir lá salvar. Quantos homens tiveram sua família inteira assassinada por uma máfia e tiveram que buscar vingança dizimando sozinhos todo um exército? Quantas profecias milenares apontaram para um escolhido que era um rapaz completamente comum? Enfim, as histórias se repetem e pra mim tudo bem.

Bom, quase tudo bem. Chega uma hora que cansa, né, quando a fórmula é exatamente a mesma e parece que o enredo foi escrito por um algoritmo que analisou as últimas 100 histórias que lançaram do gênero e cuspiu o que deu. Mas, quando se utilizam dos clichês apenas para subvertê-los ou então para trazer uma realidade diferente do que acreditávamos ser uma experiência universal, meus olhos brilham.

É aquilo, gente, clichês são ótimos, mas clichês gays são melhores ainda. 

Sério, imaginem o filho gay do presidente sendo sequestrado e mandam atrás dele um agente especial que também é gay. Não me importam quem são os atores ou o diretor desse filme, eu já quero assistir. No meu coração, já ganhou o Oscar de Melhor Roteiro Original e com sorte Melhor Filme.


Gay de Família, meu livro, segue essa proposta. Eu sempre adorei aquele clichê do homem musculoso, gostoso e às vezes um pouco bronco e perigoso, que do nada se vê obrigado a cuidar de um monte de crianças fofas. Fofas em parte, né, porque todas acabam se revelando pequenos diabinhos. Operação Babá. Um Tira no Jardim de Infância. Treinando o Papai. Eu poderia montar uma programação de uma semana com esses filmes incríveis na Sessão da Tarde e ainda assim não seria suficiente. Agora peguem esse grandão e o façam gay: isso é Gay de Família!


Escrever esse livro foi tudo de bom! Tirando a parte horrível de escrever qualquer livro que é, bom, de fato escrever o livro. Mas fora isso foi muito divertido! Além de incorporar o clichê em toda sua glória, Gay de Família também me permitiu explorar uma relação que eu nunca tinha visto em nenhuma ficção mainstream: a do tio gay com seus sobrinhos.

Outro tabu que servi quebrado me perdoem é o de que gays e crianças não se misturam. Fico pra morrer com discurso de gente doida de que a única relação que gays podem querer ter com crianças é a da pedofilia. Crianças mal podem saber que gays existem. "Ai, como eu vou explicar pro meu filho dois homens se beijando?". É exaustivo. Não apenas gays, mas todas as pessoas LGBT+, pasmem, já foram crianças um dia. Nós podemos ter filhos, sobrinhos, irmãos pequenos, podemos trabalhar com crianças, as possibilidades são muitas. Tantas que chega ser um absurdo não vermos milhares de histórias retratando essas relações por aí.

Meu Deus, tô quase dizendo que "Gay de Família" é um ato político. 

Talvez seja, mas também é uma história de entretenimento! Tudo que eu espero é que o leitor se divirta como eu me diverti, que ria das piadas, ame os personagens e abra o coração nos momentos dramáticos.

Não sei se você está feliz, mas leia "Gay de Família" para ficar :)